domingo, 10 de agosto de 2014

E agora, como fica o filme?


E agora, como fica o filme?
Por Ana Lucia Gondim Bastos


Tem momentos da vida que a sensação é a de que o futuro já chegou. As perguntas que são feitas sobre nós e sobre nossos processos de delimitação identitária, passam a ser todas feitas no tempo presente: “Que projetos você desenvolve? No que trabalha? Quantos filhos tem?”. Foi-se o tempo do “O que você será quando crescer? Onde vai querer estudar? O que fará, quando a faculdade acabar?”. O futuro chega quando a maior parte das perguntas deixa de usar verbos conjugados no futuro e aí, a gente começa a se perguntar se o roteiro deveria ter sido esse mesmo e se existe perspectiva de finais felizes (ou pelo menos, finais satisfatórios). Começa a se questionar sobre as escolhas já realizadas, a pensar acerca da importância de cada um dos muitos personagens que fazem parte de tal roteiro, como se condensam, como se encontraram e desencontraram em cada momento, em cada cena... Às vezes dá vontade de amassar o papel, no qual temos impresso o roteiro até aqui, e começar tudo de novo. Mas, então, a gente pensa em tanta gente legal que já faz parte dessa história, em tantas construções sólidas, em tantas cenas que não merecem ser apagadas... Tanta coisa, momentos e pessoas que nos trouxeram até aqui, que a gente muda de ideia e resolve continuar de onde parou e não abandonar a cadeira de diretor.
Dois filmes geniais falam de momentos como esses: Fellini 8 ½  (1963) e, tempos depois, Stardust Memories de Woody Allen (1980). O “como continuar?” de dois cineastas quarentões, dois já reconhecidos mestres na arte de transportar pessoas para dentro das histórias por eles inventadas, capacitando-as a se conectarem, cada vez mais, aos seus próprios dramas. Guido Anselmi e Sandy Bates são os diretores personagens dos diretores Federico Fellini e Woody Allen. Aqueles que oferecem corpo e alma para que sejamos inseridos num universo onírico no qual os personagens de nossas vidas inteiras (ops, das deles!) possam interagir em tempos e espaços múltiplos, através dos quais  fantasia e realidade passam a se mesclar de modo muito particular, de modo à abrir a possibilidade para o novo: o novo rumo para um novo filme, um novo gênero de filme ou até para, quem sabe, uma nova forma de rodá-lo. Mas, aí, é quando se mostra possível se dar conta de que o novo não brota do nada, brota, justamente, da história já contada até aqui. E que a história contada até aqui, até que dá bastante espaço para novos finais bem interessantes. E, mais: sabe que, pensando bem, até que foi bem contada e dirigida?!

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