E agora, como fica o
filme?
Por Ana Lucia Gondim
Bastos
Tem momentos da vida que a sensação
é a de que o futuro já chegou. As perguntas que são feitas sobre nós e sobre
nossos processos de delimitação identitária, passam a ser todas feitas no tempo
presente: “Que projetos você desenvolve? No que trabalha? Quantos filhos tem?”.
Foi-se o tempo do “O que você será quando crescer? Onde vai querer estudar? O
que fará, quando a faculdade acabar?”. O futuro chega quando a maior parte das
perguntas deixa de usar verbos conjugados no futuro e aí, a gente começa a se
perguntar se o roteiro deveria ter sido esse mesmo e se existe perspectiva de
finais felizes (ou pelo menos, finais satisfatórios). Começa a se questionar
sobre as escolhas já realizadas, a pensar acerca da importância de cada um dos
muitos personagens que fazem parte de tal roteiro, como se condensam, como se
encontraram e desencontraram em cada momento, em cada cena... Às vezes dá
vontade de amassar o papel, no qual temos impresso o roteiro até aqui, e
começar tudo de novo. Mas, então, a gente pensa em tanta gente legal que já faz
parte dessa história, em tantas construções sólidas, em tantas cenas que não
merecem ser apagadas... Tanta coisa, momentos e pessoas que nos trouxeram até
aqui, que a gente muda de ideia e resolve continuar de onde parou e não
abandonar a cadeira de diretor.
Dois filmes geniais falam de
momentos como esses: Fellini 8 ½ (1963)
e, tempos depois, Stardust Memories de Woody Allen (1980). O “como continuar?”
de dois cineastas quarentões, dois já reconhecidos mestres na arte de transportar
pessoas para dentro das histórias por eles inventadas, capacitando-as a se
conectarem, cada vez mais, aos seus próprios dramas. Guido Anselmi e Sandy
Bates são os diretores personagens dos diretores Federico Fellini e Woody Allen.
Aqueles que oferecem corpo e alma para que sejamos inseridos num universo
onírico no qual os personagens de nossas vidas inteiras (ops, das deles!) possam
interagir em tempos e espaços múltiplos, através dos quais fantasia e realidade passam a se mesclar de
modo muito particular, de modo à abrir a possibilidade para o novo: o novo rumo
para um novo filme, um novo gênero de filme ou até para, quem sabe, uma nova forma de
rodá-lo. Mas, aí, é quando se mostra possível se dar conta de que o novo não
brota do nada, brota, justamente, da história já contada até aqui. E que a
história contada até aqui, até que dá bastante espaço para novos finais bem
interessantes. E, mais: sabe que, pensando bem, até que foi bem contada e dirigida?!
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