sábado, 13 de setembro de 2014

Mania de Explicação


Mania de Explicação
(Para Ana Carolina Grether, com quem compartilho o interesse pelos recados que o coração sempre está precisando mandar)
Por Ana Lucia Gondim Bastos

“Não tenho medo de crescer”- diz Isabel na véspera do seu aniversário de 13 anos – “Tenho medo de crescer por fora e continuar pequena por dentro!”. E é assim, num mergulho em suas diversas indagações e inseguranças em relação às suas construções acerca do (re)conhecimento das coisas do mundo e de seus próprios sentimentos, que Isabel encanta adultos e crianças na peça “Mania de Explicação” que Luana Piovani traz a São Paulo, baseado no livro de Adriana Falcão (diga-se de passagem, livro que já mora em meu baú de histórias, há algum tempo).  Para facilitar o entendimento das coisas, às vezes, precisamos ir fundo nelas, também descobre, a menina. A facilidade nada tem a ver com a superficialidade!  Todo período de ruptura, de grande transformação e de importantes decisões precisa desse aprofundamento em todos os sentidos que vão sendo, ininterruptamente, construídos para/na nossa experiência  no mundo, aprofundamento naquilo que faz com que desenhemos nosso caminho de maneira única e autoral.
Adverte a lagarta que já se sabe futura borboleta: “quem é dono do próprio nariz e faz o melhor que pode na direção do que deseja, não tem que ter medo do por vir". Mas, e quando ainda não se sabe o que se deseja ou que história se quer contar? Aí não tem jeito, é se conformar e pegar a estrada que nos leva pra dentro da gente, sabendo necessária a disposição para (re) encontrar cobras e lagartos que habitam ou já habitaram nossos armários, sótãos  e porões, mas, também, nossos sonhos, amigos imaginários e toda sorte de personagem que dá ou  já deu contorno às nossas dúvidas, aos nossos medos, às nossas ambiguidades e a tudo mais que cabe no registro de sentimento. Lembrando que sentimento, também definiu Isabel, “é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado”.
Toda essa inevitável, às vezes cansativa e sempre repleta de inseguranças, busca por caminhos e sentidos, tecendo tramas de relações e afetos que nos vinculam e nos fazem nos apropriar de nossas narrativas de vida, é muito mais leve se contamos com uma boa dose de poesia e alegria. Nesta peça essa possibilidade de leveza é apresentada com a costura do texto realizada  através de músicas de Raul Seixas cantadas pelo elenco, num cenário de muita magia, texturas e cores.
Depois de Alice no País das Maravilhas (2003) e O Pequeno Príncipe (2006), Luana encara mais uma viagem na auto descoberta, mais uma viagem daquelas que o processo é mais importante do que o destino, porque só sabemos do destino quando já nos percebemos chegados e prontos para a próxima aventura... 

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Magia ao Luar


Magia ao Luar
Por Ana Lucia Gondim Bastos
novo endereço do blog: https://tecendoatrama.wordpress.com/ 


Ambientado em 1928, momento no qual a psicanálise já começava a ter eficácia clínica e fundamentos teóricos reconhecidos socialmente, o novo filme de Woody Allen traz, com muita delicadeza, questões acerca de produções de realidades e de (in)certezas que tocam as explicações que a elas emprestamos para construirmos nossas narrativas.
O protagonista é um renomado ilusionista inglês capaz de se passar, em cena, por um chinês que faz elefantes desaparecerem diante de uma plateia extasiada, ao mesmo tempo que desacredita totalmente na existência de qualquer tipo de mágica ou evento inexplicável pela racionalidade. Para ele, de fato, qualquer magia é mera ilusão e defende essa verdade com unhas e dentes! Até o dia em que um amigo o leva ao encontro de uma jovem médium afim de que desvende seus truques e desmascare mais essa impostora. Contudo, a tarefa, de início, já não se apresenta tão simples e Stanley começa a se encantar (com toda a abrangência de sentido que encantar-se pode ter) pela bela Sophie. É num passeio repleto de imprevistos que Stanley leva Sophie a um observatório e confessa temer a imensidão do universo. A naturalidade e leveza com que a moça aprecia o céu e suas estrelas e o romantismo que neles enxerga, parece oferecer acolhimento para o até então poderoso homem da racionalidade, que ali começa a apresentar seu menino assustado.Com diálogos espirituosos, ótimas atuações e excelente trilha musical, o filme merece ser assistido e desvendar as surpresas do roteiro seria como não respeitar a magia que propõe. Portanto, fiquemos por aqui! Mas, vale ressaltar mais essa homenagem à psicanálise (como clínica e constructo teórico) que tem como desafio nos manter capazes de encantamento com a vida - com as descobertas e encontros que oferece - sem que, para isso, precisemos tirar os pés do chão, desconsiderando nossa condição de seres vulneráveis e mortais. Assim como, de nos manter capazes de protagonizar nossas histórias, mesmo cientes de que o controle de seus destinos é sempre bem limitado e, seus caminhos, muito pouco previsíveis.