Lobos Soltos
Por Ana Lucia Gondim Bastos
Um
dia uma menininha muito pequena, que ainda trocava erres por eles, me contou que não gostava de uma música que a
irmã mais velha cantava pois quando chegava numa parte que dizia “abra suas
asas, solte suas feras”, ela imaginava uma jaula abrindo no meio de seu peito
de onde saiam muitos lobos e isso a assustava. Imagino que não era para menos!
Anos depois, um menininho, mais ou menos na mesma fase da vida, me contava de
um desenho animado que tratava de uma história de duas irmãs que precisaram ser
separadas porque uma delas não conseguia controlar o poder que tinha, ameaçando
machucar a outra.
- Era
um poder de tudo gelar, perigosíssimo - ele me alertava.
É,
pensando bem, já acompanhei muitas histórias de pessoas buscando o controle de
poderes secretos, ou melhor, assustadas com a sensação da impossibilidade de
tal controle! No fundo, no entanto, elas sabiam que não seria possível
armazenar a força desses poderes, a vida inteira, dentro de si , sem canais
para drenagem na realidade
compartilhada, e me pediam ajuda para dar conta disso. Tive que acompanha-los no caminho que os levou a que percebessem que
tais poderes não precisariam/deveriam ou poderiam caminhar de forma marginal,
na verdade, faziam parte da vida e, integrá-los ao resto das outras motivações que os
colocavam pra frente e os faziam sonhar, seria condição para construção de finais
felizes, para qualquer história contada na vida real.
Bem,
depois de ter me atirado na jaula dos lobos daquela criança linda de olhos
expressivos, que me falava de lobos com os olhos sempre marejados d’àgua e
depois no mundo gelado de quem não controlava o poder de tudo congelar, tive a
oportunidade de reviver tudo isso, agora, no universo adolescente dos
lobisomens. Daqueles que estão vivendo, na pele, a transformação, por vezes,
incontrolável! A desconfortável sensação de quem nunca encontra a mesma imagem
quando se procura no espelho, daqueles que ainda desconhecem sua força ou, ainda, desconhecem do
que são capazes (ou incapazes, o que é muito pior!).
Uma
vez por semana, venho assistido a episódios da série teenwolf e, aos poucos,
vou entendendo, mais e mais, acerca de tal desconforto e dos muitos receios que acarretam as
transformações e suas consequências, nem sempre previsíveis. Já precisei, devo
confessar, me haver com tudo isso mais de uma vez por semana, em função das transformações
que nem sempre obedecem a uma periodicidade. Contudo, hoje, descobri algo que
deu novo rumo para o caminho desse adolescente, o tornando muito menos
angustiante. Ele me explicou (e me mostrou o episódio que tudo esclarecia) que
alguns lobisomens se descobrem “true alphas”, pessoas que lidam com seu lado
lobo fazendo escolhas que não machucam ninguém, ainda que sem o total controle
dos impulsos. Que coisa boa poder confiar nessa possibilidade! Foi assim que
presenciei mais uma história na qual o lobo mal é vencido, mas, não por ter
sido morto, e sim por ter ganho espaço na história. Lindas histórias de
valentes protagonistas que topam o cara a cara com seus lobos... como aprendo
com eles!