Onde Whiplash esbarra no
Cisne Negro
Por Ana Lucia Gondim Bastos
novo endereço do blog: https://tecendoatrama.wordpress.com/
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Dois jovens no início de suas trajetórias profissionais,
buscando abrir espaço para mostrar a que vieram: Andrew com suas baquetas e
Nina com suas sapatilhas. Andrew tem
apenas o pai como figura parental de referência e Nina, apenas a mãe. O pai de
Andrew parece se sentir tão abandonado quanto o filho, por uma mãe sobre a qual
pouco se sabe, pois a dupla pouco conversa, apesar de se fazerem companhia,
principalmente para assistir a filmes comendo pipoca (aliás, os raros diálogos
entre pai e filho se limitam à comentários sobre a pipoca da hora do filme). A
mãe de Nina demostra a todo momento ter sua vida girando em torno da vida da
moça, ainda tratada como criança, ou melhor, tratada como uma boneca na qual a
mãe projeta todos os seus ideais. São personagens de filmes e de diretores
diferentes. O primeiro é o personagem central de Whiplash de Damian Chazelle
(indicado ao Oscar de melhor filme de 2015) e interpretado por Miles Teller. A
segunda de Cisne Negro de Darren Aronofsky (indicado ao Oscar de melhor filme
em 2011), interpretada por Natalie Portman. Têm em comum, além da juventude, a
atitude de isolamento, a insegurança, a dificuldade de relacionamento e o sonho
de encontrarem um lugar ao sol, um caminho de sucesso nas artes escolhidas: ele
na música e ela no ballet. Sim, a determinação e a disciplina são outro ponto
em comum desses jovens que nos cativam, inclusive, por suas fragilidades.
Impossível não assistir a um desses filmes sem torcer por eles! Torcer para que
fiquem bem, para que passem a curtir as possibilidades que a música ou a dança
podem lhes oferecer, para que se relacionem de forma mais leve com o mundo e
para que, sim, tenham seu esforço reconhecido. Mas, eles parecem querer mais
que isso, eles precisam de uma aprovação, de um reconhecimento e de um
desempenho sobre humanos. Sofrem da sensação de nunca serem suficientes.
Suficiente para que? Acho que não chegam a se perguntar. Mas, encontram em seus
destinos um maestro (no caso dele) e um
coreógrafo (no caso dela), convencidos de terem a medida da excelência e
dispostos a passar por cima de qualquer limite e a correr qualquer risco para
chegar onde querem: na execução perfeita da música ou da dança. Um encontro
que, em alguns momentos, pode até parecer promissor, mas, que logo evidencia
seu poder desorganizador e destrutivo. Os cartazes dos filmes contam de uma
boneca de porcelana quebrada e de um rapaz que tem nas baquetas trampolim para
um abismo: cartazes que contam tudo, traduzem os filmes. Apesar de terem optado
por formas diferentes de desfecho para seus roteiros, os diretores, nessa perspectiva que apresento, falam
da mesma coisa: da inconsequente falta de cuidado com a fragilidade humana que
algumas relações comporta, e da inversão de valores que acontece toda vez que a
busca pela perfeição impede de se observar limites humanos. O sentido da vida
passa a escapar da própria vida, a se sobrepor a ela. Assim, ela passa a ser apenas
um meio para se deixar um legado de perfeição, ainda se morra mais cedo, mais
rápido e de forma mais dolorosa. Num dos filmes isso fica explicitado no
desfecho, no outro, nem tanto. Contudo, o final dramático me pareceu evidente
em ambos. Me surpreendeu, portanto, ouvir opiniões que traziam a ideia de que um dos personagens tenha obtido um “final feliz” na busca pela
perfeição. Até porque a perfeição marcaria o fim do desejo, o encerrar de qualquer
busca, em outras palavras, se refere à morte. Seria esse o “final feliz” que
tais opiniões expressam ou será que não se deram conta do preço pago pela tal
busca da perfeição?
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